domingo, 1 de fevereiro de 2015

A Ponte, 2006 - Uma reflexão sobre suicídio


As vezes me pego pensando qual é o limite da arte, até que ponto o documentário, por exemplo, não se torna uma invasão? Há uma necessidade de exploração de temas, filmar é muito fácil hoje em dia, então não existe, eu diria, nada particular hoje em dia, o registro pode ser feito e, em mãos erradas, se transformar em armas contra a moral, ou ferramentas de vingança, no mesmo tempo, existe aquelas pessoas que fazem coisas que qualquer um poderia fazer, mas nunca teria coragem e/ou capacidade de mostrar. O documentário resgata muito a ousadia, eu diria, se sustentado por um ponto de vista - dependendo do conteúdo ele pode tentar induzir isso na cabeça do espectador - mas, no documentário "A Ponte", de 2006, isso não está muito presente, a proposta é ser indiferente, perante as particularidades de atos suicidas, os quais, ao meu ver, possuem um alto grau de arte. 

Bem, eu já pensei em me matar diversas vezes, mas quando só se pensa, é uma coisa. O problema é quando o pensamento se torna um objetivo, aqui tento explicar, a ideia de se matar ultrapassa a sua intenção para com o futuro, você começa a analisar toda sua vida, o pensamento da morte acaba, consecutivamente, te matando. O que realmente deve ser a pior parte, há alguma coisa tampando a sua visão. A vida perde a graça, mas não é brincadeirinha, se cortar, se castigar, é não ver sentido algum, como se a vida fosse um show, do qual você não foi convidado e, se foi, foi por engano. As dores do vazio são motivados, claro, por algum motivo, porém o estar perdido não escolhe uma razão, então você olha para o lado, vê muito mais sofrimento e se acha injusto, se acha fraco, aliás, talvez seja, não quero generalizar, falo em base ao que eu sentia. Aliás, é um sentimento muito recente, então é sempre muito difícil colocar em palavras essa aflição terrível chamada perda. Perdemos a vontade de nos olhar no espelho, a realidade não é mais um bom lugar para se viver, o amor não é o suficiente.

Porém! Há uma certa glamourização do suicídio, como se ele, por si só, fosse um grande espetáculo individual, o documentário chega a citar isso, inclusive, é tentador, um tanto quanto viciante, a ideia ou projeção da vida sem você, ainda mais quando você se acha um verme, não por se achar o centro, talvez realmente todo suicida é egocêntrico, mas eu acredito em dúvidas. A vida é estranha, se você tira o sorriso, a diversão, os amigos, as experiências, o que sobra de bom? Quando não se tem ânimo para nada, você começa a ver a essência da coisa toda, o universo se despe na sua frente e, a partir dai, é cair na toca do coelho, aliás, esse buraco não tem fim até que... BOOM! Você dorme para sempre. No meu caso, cético quanto a eternidade ao lado do papai do céu, ou uma adorável eternidade queimando em um mar de enxofre, nem isso eu podia almejar. Visto que, para mim, depois de morrer >> TUDO PRETO.

Hoje me vejo tentando utilizar a melancolia da forma que, meus grandes ídolos conseguiram/conseguem: Fazendo piada, expressando. Busco formas de esquecer a mim mesmo, esquecer meus sentimentos, me usar como ferramenta para fazer feliz quem eu puder, ou passar algo, ou ajudar pessoas que estão na mesma situação que eu estive - sim, já aconteceu de encontrar pessoas assim, mais de uma vez - então minha relação com a depressão virou uma espécie de amizade desconfiada. Eu não confio nela, ela não confia em mim, enfim, temos uma personalidade bem cafajeste, mas ambos somos professores, e eu, na maior humildade, tento mostrar para as pessoas que, se não fosse a vida, nem oportunidade para sentir a perda você teria, há sempre algum motivo. E, nessa questão, a arte é minha bíblia. Nunca escrevo apenas sobre cinema, escrevo sobre todos nós, até porque eu não entendo cinema, o cinema não é uma escolha minha, eu fui escolhido por ele.

O documentário "The Bridge", então, se desenvolve em base a filmagens feitas, por um ano, da ponte Golden Gate, em São Francisco, inicialmente com a desculpa de estar fazendo um documentário sobre engenharia, a intenção na verdade era filmar 24h por dia a ponte, afim de registrar suicídios, visto que a ponte atrai muitas pessoas que querem se matar. Eric Steel e sua equipe partem, então, para depoimentos dos familiares das pessoas que se suicidaram, os quais, para minha surpresa, se mostram muito maduros diante a essa horrível situação, muito por conta de conhecerem muito bem os suicidasse, sendo assim, sabiam que era questão de tempo. 

Mesmo com os corpos atirados nas águas, eu diria que o mais incômodo são os momentos que antecedem a ação, aquele andar de um lado para o outro, parece que você sente o desespero ou, quem sabe, alívio existente ali, mesmo que estejamos diante uma arte irreversível, apenas da magnitude ao fechar os olhos, há um para sempre de nada. Só lembranças, ao mesmo tempo que a eternidade, então é realmente muito complexo julgar. Confesso que me identifiquei com Gene, um dos relatos/registros, não só pelo rock estar vinculado a imagem, como sentir, de alguma forma, que esse ser humano foi, de fato, o que mais teve dúvidas, até que, na última e mais impactante cena, ele sobre na grade de costas, braços abertos, como se estive crucificado mesmo, e se lança de costas, no tempo que temos uma narração que diz "talvez ele só quisesse voar".

“O que estou tentando dizer, é que não queria que ele se sentisse numa gaiola dentro de si próprio. Dizem que o corpo é um templo, mas ele achava que seu corpo era uma prisão. Nos seus pensamentos... Ele sabia que era amado, sabia que tinha tudo, que podia fazer tudo, mas mesmo assim, sentia-se preso. E aquela foi a única forma de ser livre.”

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